Prefácio | A Prescrição das Pretensões Coletivas

Prefácio

Com muita alegria e satisfação que recebi o amável convite da professora e juíza do Trabalho, agora Doutora em Direito, Dra. Lorena de Mello Rezende Colnago para elaborar o prefácio desta importante obra jurídica, mais uma entre várias outras por ela já elaboradas e publicadas, porém talvez o seu maior desafio nos últimos anos, entre seus vários e valiosos trabalhos científicos.

Entretanto, esse livro ostenta um valor especialíssimo à autora, pois representa o fruto de sua tese de Doutoramento em Direito, defendida com sucesso e honrada com nota de destaque, na verdade com dois títulos acadêmicos, um de distinção e outro de reconhecimento para efeito de publicação, que foram conferidos à autora pela banca de Defesa de Tese de Doutorado apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, tradicional Arcadas do Largo São Francisco, presidida por mim, sem direito a voto, na condição de orientador, e aprovada por unanimidade pelos demais integrantes, professores Doutores Antônio Rodrigues de Freitas Junior, Guilherme Guimarães Feliciano, Raimundo Simão de Melo, Clarissa Ribeiro Schinestsck e Hermes Zaneti Junior.

A Juíza e Professora Lorena de Mello Rezende Colnago, neste momento particular, brinda o mundo do Direito com mais essa importantíssima contribuição jurídica, até o momento sem similar e precedente na academia brasileira, colmatando, na verdade, uma grande lacuna doutrinária e legislativa, diante do fato que é a primeira obra jurídica a se dedicar integralmente ao tema da prescrição e seus efeitos (impedimentos, suspensão, interrupção e prazos, no Brasil e no direito estrangeiro) no domínio do Direito Coletivo do Trabalho e, por extensão, no Processo Coletivo do Trabalho.

É cediço que o tema suscita inúmeras dúvidas e especulações no mundo do Direito, justamente pelo fato de que os conflitos moleculares, de massa e fragmentários advieram às relações jurídicas com maior intensidade, a partir da década de setenta, época em que surgiram os primeiros estudos de doutrinadores italianos e progressivamente pelos estudiosos americanos, que deram ensejo à gênese do microssistema de tutela coletiva e das “class actions” do direito norte-americano.

A aceitação da prescrição, como sendo instituto do direito material, porém produzindo efeitos predominantemente processuais, e não apenas causa direta de extinção do direito material, foi contemplada, inicialmente, no Código Civil Napoleônico, de 1805, tendo sido acompanhada no século XX pelos códigos da Alemanha e da Suíça. Logo a seguir, o Código Italiano afastou a tese de que a prescrição se constituía em perda da ação, pelo transcurso do tempo, declarando em seu art. 2934, que são os próprios direitos que se extinguem.

Certamente com fulcro neste entendimento que o legislador brasileiro, na esteira do Código Civil de 2002, ciente do embate existente entre o direito italiano e o alemão, optou por acompanhar a tradição romanística, considerando a prescrição como causa de extinção da pretensão (entendida como o direito do credor de querer, de exigir da parte contrária, o cumprimento de determinada obrigação — por meio de uma ação) e não do direito material em si, que permanece vivo, latente, embora transformado em obrigação natural, entretanto, que tem o condão, inclusive, de suscitar entre nós o pagamento voluntário de dívida prescrita.

A beleza do instituto jurídico da prescrição, e também da decadência, reside exatamente no fato de seus prazos diferenciados para cada ramo da ciência do Direito. Daí, porque os prazos prescricionais adotados pelo Código Civil brasileiro diferem-se do prazo prescricional de cinco anos, adotado pelo Código de Defesa do Consumidor (art. 27). Além disso, para complicar ainda mais a aplicação do instituto, na seara das pretensões do trabalhador contra o empregador, provenientes de um contrato de trabalho extinto, a legislação apresenta dois tipos de prescrição (art. 7º, XXIX, da CF/88), uma de dois anos e outra de cinco anos.

Neste sentido, extremamente significativas e oportunas as palavras da Professora Lorena, ao aduzir em seu texto que “na área trabalhista, os prazos prescricionais estão previstos na Constituição Federal quando se trata de pretensão individual, mas em 2017 a Consolidação das Leis do Trabalho foi alterada para reproduzir o texto constitucional do art. 7º, XXIX, no art. 11, além de receber outras pequenas regulamentações quanto ao tema. Há regra celetista de imprescritibilidade das pretensões declaratórias (art. 11, § 1º da CLT), início de contagem da prescrição quanto à pretensão das férias não usufruídas (art. 149), impedimento da pretensão para trabalho do menor enquanto não alcançar 18 (dezoito) anos (art. 440), e de suspensão do prazo prescricional pela provocação de mediação nas Comissões de Conciliação Prévia (art. 625-G) e para o direito intertemporal (art. 916).

A omissão legislativa é complementada pelo direito comum (art. 8º, § 1º da CLT): o regramento quanto à prescrição previsto no Código Civil”. A temática da prescrição se apresenta de notável importância na sociedade atual, complexa, contingente, globalizada, reurbanizada, consumerista, politizada, altamente cibernética ou digital, descoletivizada, on-line, dominada pela técnica, ciência e tecnologia do conhecimento e da informação, que demanda novos pensares e saberes, em processo de constante transformação e evolução.

Neste contexto de alta complexidade e contingência da sociedade moderna, bem como de alta conflitualidade na seara dos direitos fragmentários e dos micro litígios, a Profa. Lorena de Mello Rezende Colnago nos apresenta a síntese de sua contribuição científica, ao propor como referencial para profunda reflexão do mundo jurídico uma síntese sobre a prescrição, nos seguintes termos: “(...) o prazo da pretensão coletiva veiculada nas ações civis públicas e coletivas é decenal, independente da categoria de direito coletivo veiculado (art. 5º da LACP e art. 81 do CDC). As multas e medidas coercitivas aplicadas pelo magistrado no curso do processo coletivo são obrigação principal. Independente da destinação para o erário público ou para um ente privado, essas multas e medidas coercitivas têm o mesmo prazo da obrigação principal. Há modulação do prazo prescricional decenal na área trabalhista quando o ilícito gerar uma tutela reintegratória, nascida com o fim do contrato de trabalho. Nesse caso, o prazo para a atuação dos legitimados coletivos será de dois anos para essa tutela específica (art. 7º, XXIX, da CF/1988), embora a indenização moral que emerge dessa dispensa coletiva siga o prazo decenal”.

Se o princípio da dignidade da pessoa humana constitui o fundamento de validade do Estado Democrático de Direito, e por que não dizer fundamento e validade da própria preservação da raça humana, natural a preocupação dos autores modernos, entre eles, a Profa. Lorena de Mello Rezende Colnago, no sentido de apresentar à comunidade jurídica modernos referenciais jurídicos que visem promover a máxima efetividade a direitos materiais legitimamente conquistados.

Daí a inegável e transcendental importância da presente obra, não apenas pelo fato de se associar aos demais autores que defendem a ascendência dos direitos individuais homogêneos à mesma estatura jurídica dos considerados superdireitos metaindividuais (difusos e coletivos), mas também de oferecer um novo parâmetro no tempo para aplicação da prescrição trabalhista nas lides moleculares, tendo por objeto os direitos metaindividuais.

Não hesitamos, ao contrário, reforçamos o reconhecimento do mérito do trabalho científico de qualidade e de profundidade analítica da Profa. Lorena de Mello Rezende Colnago, com a desenvoltura que lhe é peculiar, no tratamento da gênese, evolução e aplicação contemporânea do instituto da prescrição no direito estrangeiro e, por extensão, no direito pátrio na seara do direito material e processual do trabalho.

Desta forma, congratulamo-nos com a nobre autora pelo árduo esforço intelectual, extensão e qualidade técnico-jurídico, e notadamente pela profundidade analítica e contribuição científica que esse trabalho proporcionará aos juristas, não tendo outra opção lógica a não ser recomendá-lo fortemente ao leitor, ávido e interessado na aquisição e incorporação de nossos ensinamentos jurídicos nesse maravilhoso mundo do direito.

 

Enoque Ribeiro dos Santos

- Desembargador Federal do Trabalho do TRT da 1ª Região.
- Professor Associado do Depto. de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
- Professor convidado da Faculdade de Direito da Universidade Autônoma de Lisboa, Portugal.

 

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