Mandado de Segurança na Justiça do Trabalho
Preâmbulo
1. Mal se iniciava o século XX e já era perceptível a preocupação que tomava de assalto o espírito dos juristas mais lúcidos, no sentido de instituir-se, em nosso meio, um remédio distinto do habeas corpus, destinado a promover a defesa de direito lesado ou ameaçado de lesão por ato ilegal de autoridade. Essas ideias, fortemente influenciadas pelo sentimento republicano dos primeiros momentos, inspiravam-se, quase sempre, no juicio de amparo da legislação mexicana.
Alberto Torres, ao elaborar, em 1914, o projeto de revisão constitucional, encontrou oportunidade para sugerir a criação de um mandado de garantia, cuja denominação foi tomar por empréstimo a Melo Freire, que a utilizara quando da feitura do seu projeto de Código Criminal português.
Essa necessidade de dotar-se o nosso ordenamento jurídico de um instrumento capaz de restaurar, com rapidez e eficiência, o direito lesado ou afastar a ameaça de lesão foi exaltada por Herculano de Freitas, em 1926, quando da reforma da Constituição de 1891.
Motivados por esse ardoroso apelo, diversos Deputados apresentaram projetos de lei visando à criação desse instituto, que tão intimamente se relacionava com os ideais democráticos; dentre todos, sobressaiu o de Gudesteu Pires, ilustre Deputado por Minas Gerais, que nos falava de um “mandado de proteção e de restauração”.
Os debates parlamentares que se estabeleceram, inflamadamente, em torno do assunto, foram, todavia, bruscamente interrompidos pela Revolução de 1930, que fez cessar os trabalhos legislativos.
Mais tarde, João Mangabeira, integrante da “Comissão Itamarati, propôs a instituição de um remédio apto a resguardar “direito incontestável, ameaçado ou violado por ato manifestamente ilegal do Poder Executivo”, a que chamou de mandado de segurança; a julgar pelos registros históricos, foi esta a primeira vez que se fez uso da expressão que, posteriormente, veio a entranhar-se no gosto do legislador, da doutrina e da jurisprudência de nosso país.
O mandado de segurança nasce, oficialmente, com a Constituição Federal de 1934 (art. 113, n. 33), embora atrelado ao procedimento do habeas corpus. Essa notável concepção do gênio brasileiro acabaria por atrair a atenção de juristas de outros países, como foi o caso de Marcelo Caetano, Niceto Alcalá-Zamora e Fix-Zamudio, apenas para nomear alguns.
Tirante a Carta outorgada de 1937, o mandado de segurança sempre teve sede constitucional. No plano infraconstitucional, dele trataram a Lei n. 191, de 15 de janeiro de 1936; o Código de Processo Civil de 1939 (arts. 319 a 331) e, mais recentemente, a Lei n. 1.533, de 31 de dezembro de 1951, além de outras.
A Constituição Federal de 1988, marcada pela preocupação inovadora, trouxe a figura do mandado de segurança coletivo (art. 52, LXX), que, conforme procuramos demonstrar neste livro, nada mais representa do que manifestação sui generis do mandamus clássico (individual), do qual se desassemelha, em rigor, apenas sob o aspecto da legitimidade ativa.
2. Conceituamos a ação de segurança como o meio, constitucionalmente previsto, de que se pode valer a pessoa, física ou jurídica, para obter um mandado destinado à proteção de direito líquido e certo, próprio ou de terceiro, individual ou coletivo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, lesado ou ameaçado de lesão por ato de autoridade pública ou de agente de pessoa jurídica no exercício de atribuição de poder público. Trata-se de ação de cognição restrita e sua natureza jurídica pode compreender as espécies declaratória, constitutiva ou condenatória, conforme seja a pretensão formulada ou a índole do provimento jurisdicional emitido. O seu procedimento é especial e a sentença se submete a peculiar forma de execução.
3. Consideramos como condições da ação de segurança:
a) a legitimidade ad causam e
b) o interesse de agir.
A possibilidade jurídica do pedido não constitui, a nosso ver, condição para invocar a tutela jurisdicional do Estado, pois ela, na verdade, se entrelaça com o mérito. Com efeito, se há, no ordenamento legal, um veto quanto à possibilidade de ser deduzida em juízo determinada pretensão, é elementar que a sentença (ou o acórdão) que faz respeitar esse veto acarreta a extinção do processo mediante exame do mérito, não se podendo, portanto, aplicar à espécie a regra inscrita no art. 268, do CPC, que permite ao autor intentar, novamente, a ação.
Já os pressupostos da ação de segurança compreendem:
a) a existência de direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data;
b) a ilegalidade ou abuso de poder;
c) um ato de autoridade pública ou de quem a ela se equipare.
4. Embora, nos mandados de segurança impetrados contra atos da Administração (e não da Magistratura), as informações a cargo da autoridade coatora correspondam à resposta que, na legislação revogada, podia oferecer a pessoa jurídica de direito público interessada, isso não significa que a falta dessas informações implique a confissão presumida da autoridade. Em revelia, até seria possível pensar-se.
Não há lugar, entretanto, para a ficta confessio, pois os fatos que dão origem ao pedido devem ser comprovados por documentos, já na petição inicial (Lei n. 1.533/51, art. 6.º, caput).
De qualquer modo, a autoridade apontada como coatora (seja ela da Administração ou mesmo da Magistratura) não está obrigada a fornecer as informações solicitadas — conquanto possua, via de regra, indiscutível interesse em prestá-las, em defesa do ato impugnado.
5. A despeito da orientação jurisprudencial compendiada na Súmula n. 512, do Supremo Tribunal Federal, procuramos demonstrar ser juridicamente possível a condenação do vencido ao pagamento de honorários de advogado ao vencedor, exceto se o writ for impetrado contra ato jurisdicional.
6. Na última parte do livro dedicamo-nos ao estudo do mandado de segurança coletivo, examinando-lhe a natureza jurídica, a legitimidade ativa para impetrá-lo, o seu objeto e o procedimento judicial a ser observado — sempre com a atenção presa às singularidades da Organização Judiciária trabalhista e do correspondente devido processo legal.
Como reputamos ser o mandado de segurança coletivo simples espécie — ou manifestação particular — do mandamus tradicional, concluímos que ele só se destina à proteção de direito subjetivo (das coletividades), líquido e certo, nunca de meros interesses, uma vez que a estes falta o elemento essencial da exigibilidade.
Curitiba, outono de 1992.
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