A prova no processo do trabalho

Prefácio

1. Dizia Carnelutti que a prova é o coração do processo. O tema é antigo e vasto, sobretudo em processo civil e penal. Assinala R. Bordeaux que “la théorie de la preuve em general est un dês plus vastes sujets qui puissent s’ouvrir devant l’esprit humain, la philosophie toute entière serait comprise, puis qu’elle même a pour objet la découverte de la vérité”.

Antônio Dellepiane enfatiza que a teoria da prova judicial é um capítulo de lógica aplicada e, como tal, compreende o conhecimento ou a referência de problemas de psicologia e até de metafísica, o que foi reconhecido por Bonnier, que procurou assentar as bases filosóficas da prova judicial.

O objetivo da prova, para Chiovenda, é criar no espírito do Juiz uma convicção que lhe permita conhecer quem, das partes do processo, tem razão e direito. Só há pouco tempo que a prova vem interessando aos estudiosos do Direito Processual do Trabalho.

A CLT, que engloba o Direito Material e o Direito Processual do Trabalho, dedica apenas treze artigos às provas (art. 818 ao art. 830), quase todos relativos à prova testemunhal. Trata da prova documental apenas no art. 830, tal qual acontecia no México, antes do advento da reforma do processo laboral, de 4 de janeiro de 1980, que entrou em vigor em 1.º de maio do mesmo ano, e dedica ao assunto toda uma Seção do Capítulo XII, em dezessete artigos.

O nosso CPC, art. 332, admite como hábeis a provar a verdade dos fatos da causa tanto os meios legais como os moralmente legítimos, ainda que não especificados no Código, “o que significa prova produzida às claras, sem subterfúgios, sem surpresas, sem armadilhas e com absoluto respeito à personalidade humana”. São palavras de Serrano Neves, que aduz, a propósito: “Aí está, com efeito, uma codificada aspiração da civilização jurídica. Aí está um pressuposto essencial, na ausência do qual a prova se torna, numa sociedade democrática, apenas um zero à esquerda”.

2. Mister se fazia uma obra especializada sobre a prova no processo do trabalho. Surge ela, agora, de autoria do jovem e culto magistrado e professor paranaense Manoel Antonio Teixeira Filho, apreciando na mais alta região da teoria as questões indispensáveis e escudando-se numa bibliografia rica e apropriada, nas três partes e nos vinte e cinco capítulos em que desdobra o livro.

Seu valor de processualista de escola já ficara demonstrado em Os Embargos de Declaração na Justiça do Trabalho e nos Comentários às Súmulas Processuais do TST, que vieram a lume, pela LTr Editora, em 1979 e em 1981, respectivamente.

Sem dúvida, uma tarefa difícil, de que se saiu galhardamente o autor, porque a temática é ampla e nova, envolvendo a possibilidade de uma teoria própria sobre a prova no processo do trabalho em relação com os princípios em que se funda a autonomia do Direito Processual do Trabalho e, em especial, as questões da indisponibilidade, da posição do Juiz do Trabalho, seus poderes e a ordem público-social, a extensão da atividade probatória inquisitiva, os graus de liberdade na apreciação da prova, a maior distribuição da carga da prova sobre a empresa, com o aventado pelo espírito percuciente e brilhante de Héctor-Hugo Barbagelata, e o axioma de que a inversão do ônus da prova é feita para favorecer o empregado, como sustentamos em congresso internacional (São Paulo, 1972).

Desde o preâmbulo, Manoel Antonio Teixeira Filho situa a prova no seu campo específico, que é, hoje, o processual, e não mais o material, como o faz o legislador brasileiro de 1973. No Capítulo IX da primeira parte, alonga-se em considerações sobre as máximas de experiência, demonstrando a sua ampla aplicação no processo do trabalho. Ao autor não escapou a correta conclusão de que o CPC de 1973, repudiando os sistemas da “prova legal ou tarifada”, que tem sua origem no processo bárbaro, e da “íntima convicção”, segundo a consciência, com ampla liberdade, seguiu aquele adotado pelos romanos e hoje predominante, de “persuasão racional”, conforme o qual, nas palavras de Sálvio de Figueiredo Teixeira, o Juiz, ao decidir, deve agir de acordo com o seu convencimento, sem embargo da necessidade de fundamentar a sua decisão, que carece, por sua vez, alicerçar-se na lei (não na sua literalidade, mas nos seus aspectos valorativos, axiológicos), nos fatos carreados aos autos (salvo os notórios) e nas presunções legais absolutas. Teixeira Filho teve a sensibilidade de distinguir, ainda, que tal se dá também no processo individual do trabalho, mas não na ação coletiva (dissídio coletivo), em que prepondera o sistema do livre convencimento, “pois não ocorre, necessariamente, a vinculação da decisão à prova dos autos”, sob pena de se subtrair a normatividade da sentença coletiva e seu caráter jurígeno peculiar (Capítulo XII da primeira parte). No Capítulo antefinal, versando sobre presunções e indícios, corretamente não os qualifica como meios de prova, pois, como ressalta Miguel Canton Moller, a presunção resulta das deduções ou conclusões a que chega o julgador ao analisar e valorar as provas existentes nos autos, quer dizer, da análise dos fatos conhecidos se deduzem outros desconhecidos.

Da profunda incursão doutrinária sobre o instituto da prova no processo trabalhista resulta o seu raciocínio límpido de que ela é instrumento umbilicalmente ligado ao Direito Material do Trabalho, que tem caráter tuitivo, em face do que deste não se deve alienar. Vaticina, quanto à prova — como esperam os que se dedicam ao Direito Processual do Trabalho —, “que, de lege ferenda, se dote satisfatoriamente o processo do trabalho de disposições relativas à prova, de modo a evitar essas incursões ao processo civil, que, quando realizadas sem a necessária reflexão (e adequação, diríamos nós), tanto mal têm causado ao processo do trabalho”.

Bem poderia o autor dispensar o prefaciador e dizer desta obra o que afirmou Francisco das Neves e Castro sobre a Teoria das Provas e sua Aplicação aos Actos Civis, cuja sistematização iniciou no longínquo ano de 1862: “reduzir a um sistema e tratar com a maior concisão e clareza tudo o que há de mais relevante sobre este importante assumpto e facilitar o estudo de cada uma das matérias, foi a ideia que nos animou a emprehender este trabalho”.

Foi o que fez, e bem feito, Manoel Antonio Teixeira Filho.

Coqueijo Costa

 

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