Direito Fundamental ao Trabalho Digno no Século XXI (Volume II)

Apresentação

Vivemos uma era de grandes e rápidas transformações. Nos últimos 250 anos, a humanidade passou por mudanças profundas, que alteraram de forma definitiva a organização das cidades, do trabalho e da vida em sociedade. No século XXI, todas essas modificações se tornaram ainda mais intensas, impulsionadas pela tecnologia e pela robotização, especialmente no mundo do trabalho – um fenômeno que traz novos desafios, em diversas instâncias.

Nesse contexto, o Direito surge como ferramenta para auxiliar na proteção de garantias básicas aos cidadãos. No Ocidente, leis e demais normas foram criadas para trazer segurança às relações trabalhistas, especialmente porque o poder econômico pode, por vezes, subjugar o elo mais frágil dessa cadeia. Em outras palavras, em Estados Democráticos, todo e qualquer trabalhador precisa ter acesso a um patamar mínimo de direitos e garantias que lhe assegure um sentido de dignidade.

Trata-se de algo complexo, ainda mais se considerarmos o caso específico do Brasil. Nossa diversidade e tamanho trazem uma imensa gama de possibilidades para as relações laborais, aumentando os desafios nessa seara. Como o direito ao trabalho digno pode ser concretizado nas atividades do campo? E na indústria? E no setor de serviços? Mais que isso: de que forma garantir trabalho digno para trabalhadores que vivem em uma sociedade desigual como a nossa?
Sabemos, infelizmente, que o Brasil ainda patina quando o assunto é dar oportunidades equânimes para todos. O Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) de 2019, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), colocou o Brasil como o 7º país mais desigual do mundo. Levantamentos regulares feitos pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) corroboram isso, ao indicar que o desemprego e a pobreza afetam mais duramente jovens, negros e mulheres.

Somam-se à desigualdade inerente ao país os inúmeros desafios advindos do desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação – tanto ao considerarmos a necessidade de ampliar o acesso a esses recursos quanto ao levar em conta a forma como eles também têm impactado o mundo do trabalho. As relações laborais digitais são cada vez mais aceleradas, subvertem a tradicional ordem do tempo e da presença para impor sua própria lógica.

Esta coleção, coordenada pela Professora Doutora Gabriela Neves Delgado, da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília – UnB, lança luz sobre essas e outras questões relacionadas ao mundo do trabalho, urgentes e necessárias nos dias de hoje. A Doutora Gabriela é uma docente brilhante, especialista em Direito do Trabalho e que compartilha de uma visão humanista de sua área de expertise, compreendendo a necessidade de que leis e instituições pautem sua atuação com base na preservação da ética e da racionalidade, e na busca da justiça social.

Nesta obra coletiva, há também o registro da importante contribuição de uma década do Grupo de Pesquisa Trabalho, Constituição e Cidadania, cadastrado no Diretório de Grupos de Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), além de artigos escritos por autoras e autores convidados. Os três volumes reúnem, assim, reflexões de cientistas e profissionais de diversas instituições país afora, alguns deles egressos da e/ou atuantes na Faculdade de Direito da UnB. Os artigos trazem em si a essência da diversidade acadêmica, marcada pela qualidade da atuação de pesquisadoras e pesquisadores, mas também mesclada pela riqueza de suas atividades profissionais.

Cabe mencionar que o Grupo de Pesquisa Trabalho, Constituição e Cidadania também vem se destacando por suas atividades de extensão, concretizando, assim, o princípio constitucional que guia as universidades públicas em nosso país: a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. O Grupo está integrado ao Núcleo de Pesquisa e Assistência Judicial Trabalhista (NUPAJ), projeto que proporciona a atuação prática na jurisdição trabalhista de primeiro grau. Merece honrosa menção, ainda, o projeto piloto levado a cabo pelo Grupo para atuação junto aos Tribunais Superiores. Em 2016, tal iniciativa, pioneira no país, levou os pesquisadores a atuarem como amicus curiae (em latim, “amigo da corte”) no Tribunal Superior do Trabalho. Dois anos mais tarde, também foram admitidos como amicus curiae no Supremo Tribunal Federal, trazendo contribuições de relevância para o debate naquela Corte.

A atuação multifacetada do Grupo – dando origem, entre outros resultados, a práticas pedagógicas e de pesquisa inovadoras, marcadas pela excelência característica da Faculdade de Direito – traz orgulho para a Universidade de Brasília, para seus docentes, técnicos e estudantes. Ao longo de seus 10 anos, o Grupo vem honrando as premissas fundamentais que guiaram a fundação da Universidade, uma instituição de ensino superior corajosa, inovadora e inclusiva, à frente de seu tempo, empenhada na busca de soluções democráticas para questões nacionais e internacionais.

Nas próximas páginas, está o registro desse trabalho conjunto e de grande destaque na área do Direito do Trabalho no país. As reflexões apresentadas certamente contribuirão para que juristas, advogados, gestores, estudantes e demais interessados tenham entendimento cada vez mais amplo sobre o assunto. Também devem estimular debates e reforçar o comprometimento daqueles que pensam o direito fundamental ao trabalho digno, em suas dimensões e desafios, para todas as pessoas – que são, afinal, o grande patrimônio de qualquer nação que se pretende desenvolvida.

Boa leitura!

 

Márcia Abrahão Moura

Professora Titular do Instituto de Geociências da UnB.
Reitora da UnB no período 2016-2020 e reeleita para o período 2020-2024.

 

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